terça-feira, dezembro 27, 2005

Estou à tua porta
Hesito entrar temendo sentir-me em casa,

Adivinhando a ternura,

antecipando o calor de me acolheres como se nunca tivesse partido,

E reconheço todos os recantos,

Que traço com os meus dedos,

E todos os detalhes

Moldados, decalcados de mim, em ti

E hesito abrir a caixa com o teu nome
Para não desvanecer o sonho,
Não diluir as cores de um quadro
Que apenas pode existir
Dentro daquela caixa fechada,
Numa casa demasiado minha
Demasiado longe,
Numa porta que hesito
Resisto

quarta-feira, dezembro 21, 2005

Muitas das boas recordações que tenho de infância, moram na época Natalícia. Montar a árvore de Natal em conjunto era uma tarefa que durava um dia inteiro, e em que todos participavam. Desde a escolha do pinheiro (na altura ainda não existiam questões ecológicas e ambientais), pinheiro natural impregnado de cheiro a resina e a pinhal, tão grande que chegava até ao tecto. Depois, instalá-lo ao fundo da sala, e decorá-lo com enfeites de todas as cores e feitios, enfeites mais antigos do tempo dos meus avós, outros mais recentes. À volta da árvore até os gatos se reuniam (gostavam de trincar a caruma do pinheiro). As luzes eram colocadas em primeiro lugar, cintilantes de magia, depois bolas de todas as cores e todos os géneros gerando do caos de cores uma alegre harmonia. As fitas pousavam por cima de todos os outros enfeites . No final, na base da árvore, construíamos um presépio com caixas e tijolos em forma de colina, que cobríamos com musgo criando uma paisagem para a vila que ali se instalava durante quase dois meses. No topo, o abrigo do menino Jesus, Maria e José, um burro, uma vaca, os Reis magos a Camelo, e pela colina abaixo, entre caminhos desenhados com areia, subiam pastores, carneiros, patos junto a um ribeiro feito com espelhos, o carpinteiro, o pescador, o festeiro, três ou quatro casas mais afastadas do topo. À volta do presépio irão ficar os sapatos na véspera do Natal, à espera das prendas, na maior parte das vezes surpresas. Eram as surpresas as mais desejadas. Quando mais velhos, pedíamos alguma coisa especifica que gostássemos mais, mas nas surpresas é que residia o mistério e a magia, mesmo nas coisas mais simples. De noite, gostava de ficar deitado no sofá, no escuro apenas com as luzes da árvore de Natal ligadas, e ficava a contemplar os efeitos de luz e sombra do pinheiro reflectido no tecto, como um céu estrelado, iluminado por fogo de artificio.

Já nas férias escolares, que antigamente costumavam ser de quase 3 semanas, passávamos os dias a imaginar a noite de Natal, a contar os dias que ainda faltavam. E a televisão tinha sempre desenhos animados especiais nesta época. O Natal dos Hospitais era outro clássico que não perdíamos. O dia inteiro com uma manta enrolados no sofá encantados com músicas inocentes e pueris do cançonetismo Português, sempre terminando com o coro de Santo Amaro de Oeiras.

Na semana antes do Natal, começava o reboliço de preparação da noite de consoada: As fritas, a bola de carne, o pudim verde, a torta de laranja, o bacalhau ou o peru recheado, os frutos secos os aperitivos. A mesa arranjada que todos queriam ajudar a preparar. A louça que apenas se usava nesta ocasião. O calor. Ainda antes dos meus irmãos começarem a casar e sair e casa, não me lembro de termos a presença de mais família que a nuclear: pais e filhos. Mas guardo a memória de uma vivência intensa, eu e os meus cinco irmãos enchíamos a casa, e a presença da minha mãe, que tudo fazia, tudo preparava para um Natal mágico. Sei que nem tudo era fácil, mas a sua presença enorme, o seu espírito maior, ofereceram-me a memória e a ideia de um Natal tão cheio de paz, de uma felicidade absoluta, inocente, intocável. A ideia feliz de Natal foi desenhada pelas mãos quentes e ternurentas de minha Mãe, as suas mãos infinitas que ainda hoje me protejem, tudo tornavam possivel, tudo tornava simples. E o seu Amor e a sua entrega, prolongam-se em mim, continuando e perpetuando em mim a ideia e o ideal de um Natal feliz.

quarta-feira, novembro 09, 2005

Na breve explicação do pai natal:
"O que desejas receber, algo que queiras muito, um brinquedo, algo de que gostes muito..."
Uma resposta pura e imaculada dos olhos de uma criança, inundam os meus de emoção:

"Quero o pai"

E é de Amor que se constroi a vida que vale a pena.

sexta-feira, setembro 30, 2005

A inocência

O sol desvirginava a janela na moldura de uma tarde de Setembro maduro, em esforço derramado nos olhos amendoados de mel colhido nas pétalas que soltava o seu sorriso. As mãos apenas uma brisa de frescura que espia a pele de cetim dourada. Apenas o silêncio nos fazia companhia, visitada pela melancolia bucólica de uma calma imaculada. O tempo ainda não fora inventado, e tudo o que sabíamos era que a eternidade existia num momento de cumplicidade. Tudo era transparente na luz ténue filtrada pelo seu olhar, e era felicidade absoluta que experimentávamos, em estado tão puro, que convoca os anjos a murmurar uma quente brisa de fim de tarde em que nos aconchegávamos.
Era a água que chorava da nascente e em risos mudos se esvaia na corrente


....

Tudo era inocência, para além de pecado, para além da dor. Esto era a minha crença Isto era o que acredito. Não eram palavras, mas sim a alma inteira despida que na tua verdade se banhava.

Eram (o tempo já passou ... ainda não foi ... será?)..

quinta-feira, setembro 22, 2005

Havia um espírito presente de forma imaterial, na musica que cantada com o coração julgávamos ouvir entre sussurros, na luz forte espelhada nas folhas douradas que desenhavam a sombra da tua ausência (presença).
Fica a certeza do eterno retorno, do novo ano prometido.

quinta-feira, julho 28, 2005

Libertação


Aceito o convite para me ausentar, sabendo que só dessa forma
regresso
reencontro-me
Sem televisão, rádio, telefone, telemóvel, jornal, sem desinformação...
Desintoxicação

Silêncio

Sou uma poeira que vagueia no deserto

Tanto espaço, sou céu
os meus braços mar aberto
O meu peito vendaval
levado em liberdade
rasgado por dentro

Encontro-me finalmente

O meu olhar é uma gota do mundo
Oráculo de verdades adormecidas
Sementes largadas sobre ideias que nascem

palavras

vsisiveis apenas pelo contorno do silêncio nos meus lábios
na areia do deserto só a sombra de algo não visivel,
mas que a luz desenha em continentes que serão meu corpo
selvagem, cavalgado em suor sem redeas
sem restea de passado
Só amanhã eu feito luz que retorna para além da sombra que ainda sou

sexta-feira, julho 08, 2005

Palavras (em construção)


Um novo mundo nasce
Sempre que os dias se fazem pétalas,
Plumas que pairam no céu
Alando de desejo as palavras

Soltas dançam brincam
Em gomos de luz insinuantes
De curvas sinuosas que rabiscam
Promessas de sonhos inocentes

É de essência a sua sede
revelam o sabor de Ser
E sem saber são liberdade

A vida é uma flor de dias
Preenchidos de palavras
Poema que em mim se espraia

segunda-feira, junho 27, 2005

A tardinha chegava junto de nós dourando-te a pele. E quando pousavas os frutos que colhemos, esvoaçava o aroma a laranja nas ondas do teu cabelo. Hesitava, evitava o seu apelo, fugia o olhar caindo na armadilha das minhas mãos roçarem as tuas. Dedos longos, esguios que desenhavam sonhos quentes no ar que respirávamos. E o que dizíamos já não morava nas palavras que deixavam a nossa boca, e disfarçávamos a cumplicidade apenas com um sorriso infantil.
Podíamos afinal, tu e eu
O calor de Junho, o rumor do silêncio visitado pelas cigarras, a ausência do mundo, feito nosso mundo

Já dizias que me amavas, mesmo sem palavras, que é a forma mais pura de desvendar a essência do amor. Eu sabia-o, sentia-o. Ainda assim pressentia as palavras a palpitar dentro de ti, timidamente querendo despertar, primeiro a lápis, depois a fogo gravadas em mim. Palavras que se fazem tijolos da minha história.

sexta-feira, abril 15, 2005

O tempo implacável esvai-se no pulsar dos dias.
Mas existe sempre um fio que nos conduz, que nos liga a um propósito, um sentido, uma missão. E por vezes só à distância nos apercebemos da obra criada pelo trilho que vamos traçando.
Como o pintura que se cria no detalhe e no pormenor, mas que só se contempla quando dela nos afastamos. E pelo meio sucede-se o turbilhão de cores e matizes, cores claras e alegres, cores quentes e fortes e as outras. Cores escuras, sombras que ajudam a realçar a luz, essenciais para dar forma e vida à obra. E continuamos, desenhando, rabiscando, pintando, esbotando, e a cada pincelada acrescentamos sempre algo mais à nossa obra.


Regresso. Ausento-me.
Hesito. Persigo.

quinta-feira, janeiro 27, 2005

Escutava uma música distante, desenraizada da sua origem, desprovida do ambiente que lhe deu significado, e hoje cada vez mais perto de um símbolo arqueológico. Quem a ouve sem saber onde ela nasceu, que ambientes preencheu, a que noites e estados de alma deu sentido, quem não a conheceu quando ela aconteceu, não a percebe hoje.
- As teclas do piano numa melodia que insiste em tocar a minha memória
Olho para o titulo da música, para o artista, ultrapassado, renegado pelo tempo. Hoje é vulgar, out of fashion, pop disco sound anos 70, ou uma outra etiqueta qualquer.
- e a melodia encontra caminhos dos quais já não me recoradava
O som que ouço não passa pelos ouvidos, passa pela emoção. Transporta-me a um mundo distante, em que o Inverno percebia-se pelo calor dentro de casa, e não pelo frio das pessoas, das ruas... Fecho os olhos, sinto de novo o coração da minha infância que bate ainda vivo, puro, ignorante do mundo lá fora, seguro de um amor maior, repousado num tempo infinito, de um sonho que não termina nunca. O futuro não existe, e o passado só existe como raiz do presente.